Caio um ex-viciado e culpado por um assassinato, depois de muitos anos afastado da capital, de onde havia saído e constituído uma nova vida, decide visitar novamente o Rio de Janeiro durante o natal. Chegando lá, encontra o pesadelo que havia deixado, iniciando ali uma intensa discussão interna extremamente conflitante entre seu passado, representado pela sua família, amigos e a própria cidade, e seu presente, ou seja, seu eu atual.
Uma família totalmente desestruturada, onde o diálogo é inexistente e manter as aparências de ‘unida e feliz’ estão sempre em primeiro plano, as relações de todos os personagens com Caio, exceto as crianças, são demasiadamente complicadas e pendentes, o que acaba se somando aos problemas cotidianos daquele grupo de pessoas. Eles se tratam, todos, como imensas cargas sobre seus ombros, não se suportando em nenhum momento, sem uma sequer cena de amor puro e simples, pois estas estavam sempre acompanhadas por um pacote de densidade problemática representada pelo silêncio cortante de vários diálogos ao longo de todo o filme.
A câmera é genial, muito moderna. Com os famosos ‘ângulos possíveis’ o telespectador se sente intrometido naquela história, dando um tom de realidade gigantesco. Closes constantes nos olhos abalados das personagens, mesclados as suas respectivas rugas, impressionavam e concretizavam ainda mais os conflitos expostos. O silêncio já mencionado acompanhavam esses closes.
Cenas retratando a luta com si mesmo eram intercaladas a outras que havia inteiração de personagens. As primeiras citadas eram profundamente bem construídas, onde o conflito era ainda mais explícito do que acirradas discussões entre as pessoas da própria família. A viagem para dentro de si era assustadora, resultando em castigos realizados por eles próprios, como fumar e beber sem parar. Esse modo de se torturar contribuía ainda mais para a realização do mergulho em si mesmo, pois o uso de drogas intensificava o sofrimento e a sinceridade.
A impressão de má explicação fica quando acabamos de ver o filme, pois o passado de Caio se torna cada vez mais interessante ao longo do filme, despertando grande curiosidade do telespectador e este não é totalmente esclarecido, porém o centro do longa não é a construção de uma história bem detalhada, e sim os problemas de uma família desestruturada que acabam ganhando maior ênfase em épocas em que todos se reúnem, como o natal.
Esse é o primeiro filme dirigido por Selton Mello, o qual a direção de arte é maravilhosa, o uso da luz conjugado a uma trilha sonora simples e bem escolhida resultam num longa denso e bem objetivado. Os atores Paulo Guarnieri, Leonardo Medeiros, Lúcio Mauro, Darlene Glória e Grazielle Moretto estão impecáveis. O longa recebeu 3 indicações ao Grande Prêmio Cinema Brasil e ganhou outros prêmios muito bem merecidos.