domingo, 2 de agosto de 2009

FELIZ NATAL (Selton Mello)


Caio um ex-viciado e culpado por um assassinato, depois de muitos anos afastado da capital, de onde havia saído e constituído uma nova vida, decide visitar novamente o Rio de Janeiro durante o natal. Chegando lá, encontra o pesadelo que havia deixado, iniciando ali uma intensa discussão interna extremamente conflitante entre seu passado, representado pela sua família, amigos e a própria cidade, e seu presente, ou seja, seu eu atual.

Uma família totalmente desestruturada, onde o diálogo é inexistente e manter as aparências de ‘unida e feliz’ estão sempre em primeiro plano, as relações de todos os personagens com Caio, exceto as crianças, são demasiadamente complicadas e pendentes, o que acaba se somando aos problemas cotidianos daquele grupo de pessoas. Eles se tratam, todos, como imensas cargas sobre seus ombros, não se suportando em nenhum momento, sem uma sequer cena de amor puro e simples, pois estas estavam sempre acompanhadas por um pacote de densidade problemática representada pelo silêncio cortante de vários diálogos ao longo de todo o filme.

A câmera é genial, muito moderna. Com os famosos ‘ângulos possíveis’ o telespectador se sente intrometido naquela história, dando um tom de realidade gigantesco. Closes constantes nos olhos abalados das personagens, mesclados as suas respectivas rugas, impressionavam e concretizavam ainda mais os conflitos expostos. O silêncio já mencionado acompanhavam esses closes.

Cenas retratando a luta com si mesmo eram intercaladas a outras que havia inteiração de personagens. As primeiras citadas eram profundamente bem construídas, onde o conflito era ainda mais explícito do que acirradas discussões entre as pessoas da própria família. A viagem para dentro de si era assustadora, resultando em castigos realizados por eles próprios, como fumar e beber sem parar. Esse modo de se torturar contribuía ainda mais para a realização do mergulho em si mesmo, pois o uso de drogas intensificava o sofrimento e a sinceridade.

A impressão de má explicação fica quando acabamos de ver o filme, pois o passado de Caio se torna cada vez mais interessante ao longo do filme, despertando grande curiosidade do telespectador e este não é totalmente esclarecido, porém o centro do longa não é a construção de uma história bem detalhada, e sim os problemas de uma família desestruturada que acabam ganhando maior ênfase em épocas em que todos se reúnem, como o natal.

Esse é o primeiro filme dirigido por Selton Mello, o qual a direção de arte é maravilhosa, o uso da luz conjugado a uma trilha sonora simples e bem escolhida resultam num longa denso e bem objetivado. Os atores Paulo Guarnieri, Leonardo Medeiros, Lúcio Mauro, Darlene Glória e Grazielle Moretto estão impecáveis. O longa recebeu 3 indicações ao Grande Prêmio Cinema Brasil e ganhou outros prêmios muito bem merecidos.



sexta-feira, 31 de julho de 2009

APENAS O FIM (Matheus Souza)


Leve e simples, Apenas o Fim é o primeiro trabalho de Matheus Souza (com seus recém 20 anos de idade), aluno de cinema da PUC Rio de Janeiro, que, com seus colegas de faculdade, decidiu realizar um longa utilizando os próprios equipamentos da universidade, tanto é que o filme é rodado inteiramente dentro da PUC.

Com planos predominantemente fixos, o filme era intercalado por cenas do passado de Tom e sua namorada, quando esta ainda não havia comunicado que iria embora de vez do Rio de Janeiro, com diálogos comuns numa relação amorosa, porém, com pitadas de uma esfera totalmente satirizada pelas mídias, ou seja, os costumes e manias do mundo nerd. Aliás, essa esfera nerd presente em todo o longa, é a essência do humor discreto do roteirista/diretor.

O personagem Tom é muito mais exposto ao público e, mesmo que o filme seja uma eterna discussão de relação, ele é absolutamente mais bem construído que sua namorada, ainda mais por ele ser expectador das decisões dela. Já esta, é menos trabalhada, parece ser até certo artifício para a melhor construção do próprio Tom, colocando-o em situações que o descifravam ainda mais.

O roteirista conseguiu muito bem abordar a concepção e os pensamentos mais comuns da juventude universitária atual, algo que a mídia em massa não apresenta muita capacitação para realizar. Através de piadinhas, indo das cinematográficas e mais cultas, a referencias a fast-foods, as comparações feitas pelo casal durante suas discussões ‘filosóficas’ e totalmente hipotéticas, são o retrato dos jovens globalizados.

A influência explícita do estilo Allen no filme é algo que me agradou muito devido a sua temática, ou seja, relacionamento amoroso em conflito, que Woody Allen aborda de modo incrível, o que lhe rendeu obras-primas como Annie Hall. Diálogos engraçados, simples, e ao mesmo tempo tão profundos são marca tanto de Apenas o Fim quanto de toda filmografia de Allen.

Outra referencia que esse longa nos remete é ao filme ‘Antes do Amanhecer’ e “Antes do Pôr-do-sol’ de Richard Linklater, que são filmados fazendo alusão a um dia de conversa, sendo este decisivo para o futuro da relação dos personagens em questão.

Romântico e realista no ponto de vista de relações amorosas e seus destinos, Apenas o Fim apresenta algumas falhas de edição, e usando de algumas técnicas clichês para emocionar o público, como uma coletânea de imagens do casal feliz sendo exibida exatamente durante sua separação, a trilha sonora é muito original dando um toque leve à trama. O novato diretor/roteirista está de parabéns com um filme tão agradável sendo o resultado do seu primeiro trabalho.

domingo, 12 de julho de 2009

CLOSER (Mike Nichols)


Falando de amor (e claro, sexo), Closer retrata o ser humano egoísta vulnerável e cheio de fantasias. Num clima malicioso o filme todo, dois casais se chocam, sendo um deles composto por uma ‘garota’ e um jornalista/escritor, e o outro, por um médico calculista e uma fotógrafa aparentemente muito independente.

Os sentimentos são corroídos pelos amores externos e pelo tempo, e em 4 anos os casais se trocam e destrocam no decorrer dessa trama com um roteiro magnífico no ponto de vista de complexidade das situações que o sexo e a paixão nos coloca, em meio ao orgulho ferido e a tantas vontades reprimidas.

A direção de arte é simples, num cenário urbano, atendo-se exclusivamente à porção dramática do longa, juntamente a uma fotografia inteiramente humanizada. Entretanto, essa escolha do diretor deu grande ênfase às especificidades de cada personagem expostos a paixão, amor, sexo, ou qualquer que seja tais aventuras.

Dan(Jude Law) é o mais sentimental, sensível e romântico de todos, representando o lado mais delicado do homem, enquanto Larry (Clive Owen) é uma pessoa mais fria, calculista, que é orgulhosa e raivosa. Já Alice/Jane Jones (Natalie Portman) é uma garota cheia de traumas em seu passado e independente, e Anna (Julia Roberts) é uma mulher mais madura, apática e sedutora. Cada personagem trata do amor de um modo diferente, e isso que o roteirista soube explorar.

Diálogos geniais, apesar de, algumas vezes, muito surreais, apresentando-se no limite da sinceridade, entretêm o telespectador de modo incrível. O sucesso desse filme se deve muito a esses diálogos atrevidos intimidantes, e ao seu tema central, que é a traição e o sacrifício feito pelo ser humano em busca da felicidade incessante na vida amorosa.

A exposição da porção suja e baixa do homem e da mulher numa relação também é mostrada sem pudores e com uma consciência plena das personagens. Talvez por isso mesmo o filme não apresente cenas de sexo, afinal, este longa inteiro trata disso e este está presente em todas as cenas, na atmosfera básica da trama.

As atuações são muito boas, principalmente de Natalie Portman e de Clive Owen, que chamaram minha atenção, e que, por ironia do destino, ganharam o Oscar de melhores atores coadjuvantes. A impressão que fica é que esse filme é marcante por conseguir ser tão denso sem chocar por meio de nenhuma imagem, apenas por palavras.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

REPULSION (Roman Polanski)



Em meio a suores gratuitos, paranóias e um silêncio absoluto que era interrompido apenas nos auges de alucinação da personagem Carol, Repulsa ao Sexo impressiona e trás o telespectador pra dentro da tela, inquietando-o e exigindo deste certa maturidade para conseguir acompanhar a narrativa inteira sem interrupções.

Uma garota virgem que convive com mulheres dependentes de relações amorosas, como sua irmã Hélène que mantém um romance com um homem casado, e, além dessa convivência, ainda é cortejada assiduamente por um pretendente que, posteriormente, quando Carol mergulha de vez em sua mente, é morto mecanicamente pela mesma.

Linda e introspectiva, a personagem se tranca num apartamento e começa sua aventura em meio sua repulsa impressionante por homens. Ao lado de um coelho morto apodrecendo na sala e de cadáveres não identificados na sua bolsa, Carol atravessa corredores repletos de mãos tocando-lhe o corpo. Ela vive num tempo próprio, onde o silêncio é constante e os closes em seu rosto suado e seus olhos apáticos são ingrediente essencial para que essa repulsa atravesse a tela.

É engraçado como o início do filme é ilustrado pelos olhos de Carol em seu estado mais ativo, mais conectado à realidade, pois, após a visualização da personagem inteiramente, na primeira cena, começa o grande pesadelo que a encurrala por todos os lados. Estupros silenciosos, acompanhados apenas pelo som do relógio funcionando trazem a tona a prisão que essa viagem interior propicia a Carol.

A atuação de Catherine Deneuve e do diretor Roman Polanski é magnífico. Ela, praticamente muda durante o filme todo, atuou de modo memorável, enquanto Polanski conjugava essa atuação com uma impressionante direção de som, onde o silêncio, na maioria das vezes era a personagem mais importante em cena. Sons como telefones tocando e relógios funcionando conseguiram ser mais aterrorizantes do que grandes músicas compostas diretamente para assustar.

Uma câmera lenta e calma, juntamente a imagens preto e branco transmitem a atenção do telespectador para o rosto de Carol sempre com os olhos grandes e bem abertos e com o buço normalmente suado, resultado de suas batalha internas. O apartamento vira um caos, retratando a mente perturbada de sua habitante.

Negar importância de Repulsa ao Sexo para o cinema, principalmente no terror, é um grande erro, sendo esta uma incontestável obra inteiramente sobre o interior do homem, retratando o psicológico, que conseguiu, através da imagem, traduzir paranóias, alucinações e uma mente tomada por repulsas que provavelmente não teria sido retratada tão bem por outro tipo de mídia.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

O Leitor (Stephen Daldry)



Do mesmo diretor de Billy Elliot, O Leitor é mais uma super produção indicada ao Oscar de melhor filme. Tendo como primeiro plano da narrativa o romance cheio de desencontros cmposto por uma mulher que apresenta o dobro da idade de seu parceiro, Michael ou “Kid” como Hanna o chama durante todo o longa.

O filme caminha por vários temas ao longo de suas 3 fases(que já serão abordadas), como a sexualidade, a alienação e até mesmo por questionamentos a cerca dos julgamentos tardios que acontecem apenas em casos especiais sobre as crueldades nazistas da segunda Guerra Mundial. No caso do filme, uma das vítimas sobreviventes ao holocausto havia escrito um livro sobre sua estadia em um campo de concentração alemão e, após o ande sucesso de publicação, seu caso e o de sua família vai a “justiça”, deixando outras atrocidades que aconteceram nos outros campos de concentração e em toda a Alemanha ignorados e/ou esquecidos.

Em sua Primeira fase, amarelada e ensolarada em meio ao verão, Michael conhece Hanna e vive um grande amor com esta mulher, que após certo tempo começou a exigir a leitura de romances todas as tardes antes que suas “rotinas amorosas” começassem. Ele, totalmente inexperiente e inocente, envolve-se intensamente nessa teia de sentimentos construído pelo seu primeiro amor enquanto Hanna, mulher psicologicamente deficiente, incrivelmente sensível, fascinada por narrativas e repleta do espírito pregado pela Indústria que é a sociedade alemã completamente alienadora construída para se reerguer da derrota sofrida na Primeira Guerra Mundial.

Azulada e intensa, a segunda fase se inicia quando Michael está na universidade de direito, onde, por acaso, ele reencontra seu grande e único amor de sua vida enquanto assiste a o julgamento já citado anteriormente. Visto que Michael conhece um segredo que pode diminuir drasticamente a pena que Hanna terá de cumprir na cadeia por ter trabalhado de guarda em episódios de extremo terror, ele entra em grande fase de questionamento e desespero que se finaliza inerte decorrente do rancor, medo e desequilíbrio emocional de Michael.

A transição de atores que interpretam a mesma personagem, Michael no caso, foi simplesmente genial. A passagem de fato ocorre quando a personagem se encontra extremamente inquieto sentado em um trem em movimento que passa em um túnel, escurece a cena, e quando a luz vem novamente iluminar o acento de Michael, Ralph Fiennes, ator que o interpreta em sua fase adulta, se encontra sentado indiferente e apático, como se durante os anos passados, uma certa acomodação tivesse tomado o lugar dos grandes questionamentos que constituíam sua mente na segunda fase, que se encerra aí.

A terceira fase é acinzentada e fosca. Nela que a concretização e a identificação Michael são de fato efetuadas. Isso acontece quando a seqüência mais emocionante do longa entra vai ao ar, ou seja, o momento em que ele grava a leitura dos livros que ele havia narrado para Hanna durante o verão romântico que eles viveram, intercalado com a própria Hnna ouvindo essas fitas dentro da prisão.

Esse amor mal resolvido comprometeu completamente a vida amorosa e social de Michael, que até mesmo com sua filha e família, não conseguia se abrir e se relacionar sem medo e inquietações, mantendo apenas relações superficiais, sem profundidade nenhuma.

Essa obra baseada no livro “Der Vorleser” é bem marcada em função de Michael e suas fases, tanto sentimentais, quanto ideológicas. É impressionante a habilidade para tratar de tantos temas não superficialmente ao longo do filme que o roteirista e o diretor apresentaram. Bem construído, fazendo pequenas referências em cada cena, contando com interpretações geniais como a de Kate Winslet e direções de artes como as de Christian M. Goldbeck e Erwin Prib é uma pena “O Leitor” ter perdido o Oscar para Sumdog Mllionaire.

segunda-feira, 15 de junho de 2009


Dizem que na hora da morte, perdemos 21 gramas. No momento em que seus sonhos se diluem, suas vontades e pensamentos vão embaçando até embranquecer e se serem absorvidos pelo nada. Esse é o peso do pensamento.


Amores Perros, o quinto filme Alejandro González, diretor mexicano que dirigiu a “trilogia” de longas construídos da mesma forma, ou seja, em tempo acronológico e composto por vários núcleos que se inter-relacionam a partir de um acontecimento. É muito interessante como o roteiro é bem escrito e o processo de construção do filme foi cuidadoso ao realizar um trabalho que, de longe parece ser muito complicado para se entender, já que as cenas são organizadas, aparentemente, de modo aleatório.


Entretanto, o diretor foi muito sábio e habilidoso ao organizar essas cenas de modo que prendesse a atenção do telespectador, sempre expondo um personagem de cada vez usando uma seqüência de cenas sutis que, quase periodicamente eram interrompidas por uma nova seqüência, porém, de um novo personagem.


A Atriz Naomi Watt , ao lado de Benicio Del Toro e Sean Penn, atua magnificamente, construindo um longa-metragem que foi indicado ao Oscar e ganhou vários prêmios de outros festivais de cinema, inclusive foram eleitos, Naomi Watts e Benicio Del Toro como melhores atores pelo voto popular no Festival de Veneza.


Os outros filmes da trilogia são, o primeiro, produzido exclusivamente no México, “Amores Perros”, e o terceiro, que foi indicado ao Oscar de melhor filme, melhor direção, melhor roteiro, entre outros, além de ter levado a estatueta de melhor Trilha Sonora Original, “Babel”. Esse último e 21 Gramas foram produzidos em conjunto aos estadunidenses em virtude do sucesso do primeiro filme da trilogia.


Os três longas tratam de questões polêmicas familiares e subjetivas, como a culpa e a morte, que o roteirista mexicano Guillermo Arriaga soube entrelaçar muito bem. Aí está mais um exemplo do interesse norte-americano em trabalhos de sucesso em busca de capital, mesmo que isso corrompa a identidade da obra, o que não me parece acontecer nesse filme, visto que o roteirista e o diretor mantiveram o mesmo espírito de “Amores Perros”, mesmo depois dos EUA entrarem na jogada.


Trailer do Filme: http://www.youtube.com/watch?v=8GoQ0QAAG6M